''Eu tenho meus motivos pra ser exatamente do jeito que eu sou, acredite.''

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Sophie Calle - Cuide de você

Sophie e Gregoire somos (todos) nós





Sophie Há algum tempo venho querendo lhe escrever e responder ao seu último e-mail. Ao mesmo tempo, me pareceria melhor conversar com você e dizer o que tenho a dizer de viva voz. Mas pelo menos será por escrito. Como você pôde ver, não tenho estado bem ultimamente. É como se não me reconhecesse na minha própria existência. Uma espécie de angústia terrível, contra a qual não posso fazer grande coisa, senão seguir adiante para tentar superá-la, como sempre fiz. Quando nos conhecemos, você impôs uma condição: não ser a “quarta”. Eu mantive o meu compromisso: há meses deixei de ver as “outras”, não achando obviamente um meio de vê-las, sem fazer de você uma delas. Achei que isso bastasse; achei que amar você e o seu amor seriam suficientes para que a angústia que me faz sempre querer buscar outros horizontes e me impede de ser tranquilo e, sem dúvida, de ser simplesmente feliz e “generoso”, se aquietasse com o seu contato e na certeza de que o amor que você tem por mim foi o mais benéfico para mim, o mais benéfico que jamais tive, você sabe disso. Achei que a escrita seria um remédio, que meu “desassossego” se dissolveria nela para encontrar você. Mas não. Estou pior ainda; não tenho condições sequer de lhe explicar o estado em que me encontro. Então, esta semana, comecei a procurar as “outras”. E sei bem o que isso significa para mim e em que tipo de ciclo estou entrando. Jamais menti para você e não é agora que vou começar. Houve uma outra regra que você impôs no início de nossa história: no dia em que deixássemos de ser amantes, seria inconcebível para você me ver novamente. Você sabe que essa imposição me parece desastrosa, injusta (já que você ainda vê B., R.,…) e compreensível (obviamente…); com isso, jamais poderia me tornar seu amigo. Mas hoje, você pode avaliar a importância da minha decisão, uma vez que estou disposto a me curvar diante da sua vontade, pois deixar de ver você e de falar com você, de apreender o seu olhar sobre as coisas e os seres e a doçura com a qual você me trata são coisas das quais sentirei uma saudade infinita. Aconteça o que acontecer, saiba que nunca deixarei de amar você da maneira que sempre amei desde que nos conhecemos, e esse amor se estenderá em mim e, tenho certeza, jamais morrerá. Mas hoje, seria a pior das farsas manter uma situação que você sabe tão bem quanto eu ter se tornado irremediável, mesmo com todo o amor que sentimos um pelo outro. E é justamente esse amor que me obriga a ser honesto com você mais uma vez, como última prova do que houve entre nós e que permanecerá único. Gostaria que as coisas tivessem tomado um rumo diferente. Cuide de você.
G





Acabei de reler o email que me fez pensar em todos aqueles que já passaram pelo fim de uma relação de uma forma moderna; nele, um escritor, Gregoire, termina a relação com uma artista plástica Sophie.
Sim, ele terminou a relação por email – não por maldade (imagino eu), mas por falta de condição mesmo; afinal, nem sempre temos coragem de dizer olhando nos olhos do outro aquilo que queremos, ou precisamos dizer – e só o tempo e a maturidade nos fazem entender (e aceitar) nossas limitações.
Continuando a leitura, pensei com os meus botões: de certa forma ele é meio um modelo, um script dos “fins de romance onde ainda existe bem querer”. Sim!! Pára pra pensar: em maior ou menor escala, todos nós já dissemos ou ouvimos a maioria daquelas frases.
Engraçado… Quando amamos, acreditamos que os sentimentos nutridos pelo outro são únicos, especiais – de certa forma, amar faz com que nos sintamos diferentes dos outros, escolhidos… É, mas na verdade, não passamos de um exército de clichês, normalmente com um pezinho no cafona...
“Houve uma outra regra que você impôs no início de nossa história: no dia em que deixássemos de ser amantes, seria inconcebível para você me ver novamente. Você sabe que essa imposição me parece desastrosa, injusta (já que você ainda vê B., R.,…) e compreensível (obviamente…); com isso, jamais poderia me tornar seu amigo” (tirado do email).
Também comecei a rir, meio emocionada ( me achando uma tonta), quando li que a Sophie também dizia não querer ser amiga dele do Gregoire quando eles terminassem… Sabe o que me intriga? As mulheres vivem dizendo que os homens só querem saber de sexo (e na maioria das vezes é verdade), mas aqui e ali eles fazem exceções - digamos assim-, e nós as repudiamos (quiçá por orgulho ferido por termos sido preteridas, ou mesmo com medo de não suportarmos vermos vocês como amigos, sei lá).
Quanto a mim, nunca foi falta de romantismo, e sim pura falta de condição. Não caberia… Complicado olhar pra uma pessoa com a qual outrora conversava deitada no colo, com o seu cabelo ao alcance de um cafuné, e de repente ter aquela distância física que o racional entende, mas o coração não – afinal, desde quando coração entende dessas coisas de timing errado, de impossibilidade de convivência, de gênios e personalidades que se desgastam com o tempo? Não, coração só entende bem querer, bem querer este que o cérebro traduz por sensações de bem estar infinitas - às quais sempre queremos que sejam intermináveis.
Pois é, como Sophie, eu também não gostaria ser amiga de Gregoire. Na verdade, eu não saberia como iria conseguir ficar sem seus emails, sem ouvir tua voz, sem vê-lo me olhando e rindo de soslaio quando dizia que eu era “maluquinha” (e adorando que eu fosse assim), ou então toldando os olhos de emoção quando algo que eu te dissesse tivesse sido pertubador. É, eu não teria ideia como iria suportar a falta de ficar sem olhar o homem que fez com que eu visse a mulher que eu era; melhor pensar em vê-lo morando em outra galáxia, abduzido por extra-terrestres do que imaginar nós dois sendo amigos. Como eu poderia encontrá-lo como se nada daquilo nunca tivesse acontecido.
Ah, entendo mesmo quando a Sophie dizia pro Gregoire que jamais seria amiga dele!
Sophie pediu a Bouillier que viesse ao Brasil para conversar com ela em público pela primeira vez. E ele aceitou. Simples assim.
Mas como diz aquela música " sentimento ilhado, morto e amordaçado, volta a incomodar"... O ser humano deve mesmo ter sido fabricado em série, e veio de fábrica com o chip do clichê ambulante: como a Sophie, eu também passaria algum tempo fingindo não me lembrar da sua existência, eu me pegaria pensando em como você poderia estar… Ah sim, não sei se vocês sabem, mas ela acabou encontrando o Gregoire na última FLIP – usando igualmente uma desculpa esfarrapada, como só as pessoas que não se importam com mais nada a não ser com as saudades que sentem têm coragem de usar…
Mas pensando bem, é nisso que está a beleza de um afeto sincero e incondicional: você não se importa caso pareça ridículo e infantil, pois tem certeza que a pessoa do outro lado vai entender. Como eu sempre falo, a meu ver, todo amor verdadeiro, pleno (daqueles que não se consegue sentir muitas vezes na vida) passa pela compreensão, pela capacidade de a pessoa conseguir se colocar no lugar da outra e entender os motivos das atitudes dela.
Sabe, é sobretudo por essa capacidade de compreender que dá pra entender o “cuide-se” ao final do email; para escrever algo assim, é preciso realmente querer a felicidade do outro – ainda que não seja com você; só aqueles que se querem muito bem sabem o quanto é doído escrever (ou dizer) um “se cuida”, rezando pra pessoa ficar bem, porque não teremos condições de saber quando elas estiverem na pior; só os que se querem muito bem têm condição de apreender o quanto de maturidade (que só o sofrimento traz), abnegação e compreensão um ‘se cuida” contém…
“A conversa foi quente e explícita como a arte de ambos, mas o principal ficou para depois. Os dois não se desgrudaram em Paraty . Em certo momento, andaram a sós pelas ruas escuras do Centro Histórico da cidade. Sumiram na sombra, à luz do luar. Ninguém flagrou um beijo sequer, mas só se falava disso nos bares da cidade”.
Para mim, amor não morre; no máximo se transmuta, transcende. Morrer? Não. Disso tenho certeza. E gosto de chamar as coisas pelo que elas são. Digamos então apenas que somos pessoas perfeitamente cientes da importância e do lugar que têm na vida uma da outra, certo? E isso não é pouco (além, evidentemente, da admiração mútua que teríamos um pelo cérebro do outro).
Afortunados daqueles que podem dizer o mesmo e puderam viver isso ao menos uma vez na vida.
Se cuidem...
Beijos mil,

3 comentários:

  1. Olá.
    Gostaria de agradecer a sua visita ao meu blog, e as palavras gentis registradas.
    Cada novo amigo conhecido, é uma gota de água a mais no rio da existência.
    Muito bonito este texto.
    Se soubéssemos como é importante estar e fazer a vida de alguém melhor, não perderíamos tempo, pois a vida é tão breve.
    Um lindo final de semana para ti.

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  2. Hummm... Sabe, esse negócio de "eu te amo, vc é demais... mas não te quero mais perto de mim" para mim é pura conversa fiada.

    Ok, que me desculpem os amantes das gentilezas, mas, se quer acabar, então diga simplesmente "não te quero mais, acabou. Não te gosto o suficiente para ter-te por perto".

    Dói sim, mas ainda acho que vale mais a pena a certeza de um não, definitivo, cruel, mas que abre as portas pra um mundo de novas possibilidades, do que a incerteza de um talvez, porque, se me amam, se sou assim tão legal, bem, pode ser que amanhã ele se arrependa e retire tudo o que disse, né? Bah!

    Esse negócio de vc é importante ou vc é boa de mais pra mim, afe... me irrita! (rssss)

    Mas, de qualquer forma, um dia, tudo passa, inclusive (e principalmente) o amor, qdo não correspondido. E qdo passa, a consequência natural é essa mesmo: vc encontra a pessoa e acaba descobrindo que, no fim das contas, ele continua sendo a mesma pessoa pela qual vc se apaixonou, mas que, agora sem a purpurina da paixão pra enfeitar tudo, é só mais um cara legal.

    "Bom te ver... cuide de vc."

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  3. gostei deste texto vou ler com mais calma para poder dar um parecer justo....vc é uma pessoa muito reservada não consigo nem te mandar um convite no orkut me adiciona( nelson alvarenga)..abraços.

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