''Eu tenho meus motivos pra ser exatamente do jeito que eu sou, acredite.''

sábado, 22 de janeiro de 2011

Casamento é coisa de beijo

 

 Sempre tive esse pensamento... "beijo é o termômetro do relacionamento", se ainda tiver aquele gostinho de "quero mais" está tudo bem, mas quando você não sente nada, aquele beijo "obrigatório",  ou fica aquele gosto de "carne com carne"... está faltando algo aí...

 

Casamento é coisa de beijo

20/01/2011
Os casais britânicos brigam quase todos os dias no ano. As brigas ocorrem em geral às quintas, às oito da noite, e duram alguns minutos. As brigas acontecem por motivos banais, bem conhecidos dos casais brasileiros: as mulheres reclamam que seus parceiros não baixam a tampa da privada, não dão descarga, deixam xícaras pela casa e toalhas no chão etc.; os homens reclamam que as mulheres deixam cabelos no ralo, demoram para se aprontar, assistem novelas demais, vivem dizendo que eles prestam para nada etc. Ambos se acusam de surfar na TV com o controle remoto.  A pesquisa está nos jornais britânicos, brasileiros e de outros países.
Para um filósofo como eu, casado pela terceira vez, a lista de mútuas reclamações poderia ser muito maior – ao menos se penso no meu segundo casamento. Mas, isso, realmente pouco importa. Pois essas brigas nada significam quando outros elementos não interferem. Quando outros elementos mais importantes e, não raro, menos visíveis, interferem, então esses bate bocas banais começam a pesar no casamento. Servem de gota d’água para que ambos optem por enriquecer algum advogado abutre que espera há tempos o divórcio.
Uma boa parte dos casamentos acaba antes da chamada “crise dos sete anos”. Mas as pessoas se toleram um pouco mais porque, principalmente na classe média, não conseguem sobreviver ao que imaginam que seria o sentimento de culpa diante dos filhos. Mas, uma hora ou outra, uma dessas briguinhas tolas acaba pondo fim em tudo. Essas briguinhas, então, passam a contar como o que realmente pesou, principalmente para as mulheres que, de fato, ao verbalizarem sobre o pedido de separação, não deixam nunca – ao contrário dos homens – de citar os motivos banais como os únicos ou os prioritários.
Do mesmo modo que há uma indústria do casamento, há uma indústria do descasamento. Entre ambas, uma terceira indústria põe a cabeça, também procurando seu espaço mercadológico, a de salvação de casamento. “O casamento está em perigo”, então, eis que um conjunto de super-heróis especializados é convocado a “salvá-lo”. Das três indústrias, sem dúvida essa terceira é a mais ridícula, mesmo quando séria. Não à toa ela e a preferida do cinema, que a lança em cenas hilariantes até quando o filme não é comédia.
Realmente parece ridículo que alguém acredite que possa fazer pessoas não se descasarem se elas já não estão mais felizes juntas. Parece sempre ser algo meio que sado-masoquista. Nessa indústria tudo funciona como se padres, pastores, psicólogos, terapeutas, amigos de boa vontade e conselheiros de todo tipo quisessem, antes de tudo, ver as pessoas só se separarem depois de algum sofrimento, e não no momento certo, em que ainda poderiam preservar alguma amizade. Os casamentos acabam e as pessoas deveriam entender isso. Mas elas não conseguem entender isso e, então, alimentam uma indústria que é especialista em recrutar uma mão de obra que quando não é simplesmente desqualificada é, não raro, mal intencionada.
O que resta de um casamento que não se desfez? Apenas duas pessoas bem infelizes. Porque os filhos, em relação aos quais tudo se fez para não se divorciar, já estão em outras casas, reproduzindo eles mesmos a infelicidade do “felizes para sempre” – a maldição que se joga em vários casais que optam por casar sem perceberem que já namoraram demais e nem estão mais apaixonados, estão apenas na rotina. Uma rotina que faz algumas moças levarem pijamas para o motel!
Os casamentos podem ser eternos. Mas, para tal, é necessário que o namoro seja exercido. Ora, quando o casal não quer mais beijar na boca, quando isso não mais seduz, não há mais casamento. É claro que alguns casais continuam casados porque, desde o início, nunca houve beijo na boca bem curtido no namoro. Escravos não lutam pela liberdade, dizia Rousseau. Eu posso parafrasear e dizer: não amantes não lutam para amar. Quando não se sabe o que é o amor, não há razão para se querê-lo. Eis as frases, então: “homem é tudo igual” ou “mulher é tudo igual”. A primeira frase é da mulher que nunca foi amada, a segunda frase é, em geral, de gay enrustido.
Quem experimentou o beijo na boca como entrada para o amor e porta aberta para um casamento que vale a pena, sabe muito bem quando o casamento acabou e quando ele não acabou. Sabe, inclusive, se vai ou não acabar, caso possa prestar atenção na vida a dois mais do que presta atenção no trabalho, na roupa da vizinha ou no carro do patrão.
Os casamentos são namoros em que os parceiros resolveram testar a paciência de Deus. Mas, antes de tudo, eles são o que se pode saber pelos lábios e língua, sem que seja a fala.
© 2011 Paulo Ghiraldelli Jr, filósofo, escritor e professor da UFRRJ.

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